domingo, 29 de abril de 2012

A recaída faz parte do processo de restauração do dependente

 
A recaída faz parte da recuperação. Essa constatação me faz lembrar a historia do filho pródigo. Na Bíblia essa historia é uma das que mais me fascina. Fico a imaginar aquele pai generoso e vigilante, com o olhar fixo na estrada, num misto de aflição e esperança para reencontrar o filho perdido.
 
De longe o pai veja o filho e corre para abraçá-lo. No seu dedo coloca o anel que significa o seguinte: esse garoto tem dono, ele é meu, responsabilidade minha, intransferível, ele é meu e nada me fará desistir dele! Estou disposto a quebrar qualquer agenda para deixá-lo de pé novamente!
 

Isso se passa na Bíblia, porque na prática poucos pais estão dispostos a investir e a resistir na busca pela cura dos seus queridos. Há pais que tratam com diferença os filhos mais bonitos e inteligentes, discriminando outros. Alguns com frequência são denominados meninos problemas, causam certo embaraço na hora de apresentar a prole. Fato como esse até parece invenção, tipo humor desqualificado, mas existe aos montes e geralmente essa garotada fica anos a fio frequentando consultório psiquiátrico, quando seria o peito do pai, o afeto do pai, a disponibilidade do pai para ouvi-lo a cura de todos os seus males.
A recaída tão temida por todos, na verdade, faz parte do processo de recuperação do dependente: dificilmente não acontecerá. Poderá acontecer poucas ou várias vezes, quantas forem necessárias para ser aprendida.
 
A maior dificuldade da recaída do dependente não está nele, sim, na resposta sempre violenta e inadequada por parte dos familiares e até de amigos, que pensam em juntar cacos humanos com críticas, pressão e ameaças, em lugar de reforçar a resistência que se exauriu, a impotência que tomou conta do combalido recuperando.
A minha postura nesse caso é nunca desistir até que a restauração aconteça. O adicto leva um tempo para se adaptar à presença de pessoas estranhas ao seu mundo. São varias as mudanças: de espaço físico, comportamentais, além da disciplina, e ele fica atordoado e frequentemente oscila entre permanecer ou dar mais uma pausa. Nesse caso a melhor opção para cativá-lo é se disponibilizar e fazê-lo sentir que ele poderá retornar, que será bem-vindo para finalizar seu programa de restauração.
Todos os monitores que faziam parte da minha equipe multidisciplinar eram ex-dependentes, por essa razão têm outra leitura sobre esse incidente de percurso. Compromissados com a restauração, por experiência própria precisamente nesse momento, esse tipo de profissional é a pessoa que tem mais autoridade junto ao recuperando para persuadi-lo a dar continuidade ao tratamento.
 
Com habilidade, juntamente com a equipe, pode-se apoiar e conseguir não apenas minimizar o sofrimento moral e psicoemocional causado pela recaída, mas usar toda a dor do retrocesso para que a recaída seja apendida reforçando os sentimentos e o pensamento em favor da vida.
O crack por si é excludente, transforma o pessoa mais dócil em alguém extremamente arredio e desconfiado. Esses fatos somados à compulsão pela “pedra” que é aterrorizante e intermitente fazem com que o dependente do crack seja mais propenso a recaídas.
Nunca desistir é a recomendação aos pais! No passo a passo chegará o momento da gratificação, da melhor láurea aos pais combatentes que nunca desistirão dos seus filhos. A recuperação de fato acontece: é difícil, mas é possível, para aqueles que decidem pagar o preço.
 
* Conceição Cinti. Educadora. Advogada. Especialista em Tratamento de Dependentes de Substâncias Psicoativas, com experiência de mais de três décadas.

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