terça-feira, 29 de setembro de 2009

EUTANASIA: COMPAIXÃO OU CRIME?

"O que se lamenta é a falta de debate sobre um tema tão delicado, e talvez por ser de extrema sutileza, nosso legislador prefere deixar tudo do jeito que está, não aprovando ou reprovando concretamente esse tipo de abordagem pois, o Brasil embora seja um estado laico, sofre enorme influência de ditames religiosos."

A triste situação vivida pela família Englaro (Itália), traz à discussão um tema de extrema importância ainda não regulamentado expressamente pelo nosso legislador. Eluana, 37 anos, que vivia em estado vegetativo há cerca de 17 anos, em razão de um grave acidente automobilístico ocorrido em 1992, teve sua morte confirmada na tarde de segunda-feira, dia 9, horário local, em Udine.

Seu pai em 1997 pleiteou o direito de promover a eutanásia, porém, somente em julho do ano passado conseguiu seu pedido perante a Corte de Recursos de Milão, sendo que a Corte Constitucional italiana confirmou a decisão três meses depois, esgotando qualquer possibilidade de recursos. Perceba-se o longo tempo entre a data do pedido e data da decisão judicial. Esse triste relato se assemelha ao caso da americana Terri Schiavo que morreu treze dias após a cessação da terapia, assim, verifica-se nas duas situações a ‘‘limitação do esforço terapêutico’’, que consiste na progressiva suspensão de tratamento nos enfermos incuráveis, outrossim, desde sábado, os médicos responsáveis pelo procedimento anunciaram que a alimentação e a hidratação enviadas a Eluana por meio de uma sonda foram suspensas, e a previsão era a de que em até dez dias Eluana viesse a óbito, contudo o fim do sofrimento ocorreu antes do esperado.

Houve uma forte comoção no país da ‘‘bota’’, existindo manifestações contra e a favor da eutanásia passiva ou ortotanásia, que é aquela caracterizada pela limitação ou suspensão do esforço terapêutico, isto é, do tratamento que prorroga a vida de doentes terminais, sem chance de cura - exemplo clássico é o desligamento de aparelhos e a ativa, que é a prática direta de um ato lesivo contra o paciente, tal como ministrar uma injeção letal, sendo que o Vaticano e o primeiro-ministro de direita Silvio Berlusconi foram totalmente contrários à decisão da Corte Italiana, e a população encontrava-se dividida, note-se que é um tema muito complexo, onde não faltam vários tipos de argumentos, em todas as áreas, filosófica, religiosa, jurídica e moral.

Mas indaga-se: deve ser respeitado quem tem o direito sobre a própria vida e pretende dar um fim nela, ou devemos ignorar qualquer pedido nesse sentido, vez a vida é tão sublime que só Deus pode nos retirá-la, e eventualmente o Diabo?

No Brasil, não existe regulamentação específica acerca da permissão da prática da eutanásia (ativa ou passiva), e em tese, em um caso concreto o agente poderia estar incurso em um desses artigos do Código Penal, a saber: Auxílio ao Suicídio, cuja pena vai de 2 a 6 anos de reclusão (sendo afiançável) ou no Homicídio privilegiado, cujas penas são bem mais severas, indo de 6 até 20 anos de reclusão, contudo, com uma redução que pode chegar até o limite de um terço, sendo delito inafiançável, e cuja competência para o julgamento também é do Tribunal do Júri.

Certamente, em um caso concreto, existirão diversos posicionamentos contras e prós a eutanásia, razões consistentes sob as duas óticas, mas o que se lamenta é a falta de debate sobre um tema tão delicado, e talvez por ser de extrema sutileza, nosso legislador prefere deixar tudo do jeito que está, não aprovando ou reprovando concretamente esse tipo de abordagem, pois, o Brasil embora seja um estado laico, sofre enorme influência de ditames religiosos, e talvez uma iniciativa nessa discussão poderia acarretar algum prejuízo político.
É o que há.

obs. artigo originalmente escrito em fevereiro de 2009

terça-feira, 22 de setembro de 2009

SEM MAIS O USO DE ALGEMAS?

Supremo opta pelo fim da execração
O plenário do Supremo Tribunal Federal em 13 de agosto de 2008, mediante iniciativa própria, isto é, sem provocação de terceiros legitimados (Procurador-Geral da República, Conselho Federal da OAB, Defensor Público-Geral da União etc), conforme autorização constitucional expressa no artigo 103-A da Carta Magna, resolveu sepultar em definitivo o uso abusivo e indiscriminado de algemas nas operações policiais e nos atos processuais, vez que editou a 11.ª Súmula Vinculante com o seguinte teor: “Só é lícito o uso de algemas em caso de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade do Estado”.

A decisão da excelsa corte foi tomada em razão de diversas operações da competente Polícia Federal (porém, com o respectivo uso exagerado de colocação de algemas aos detidos), entre as quais, Têmis (venda de sentenças favoráveis aos jogos ilegais), Sanguessuga (compra superfaturada de ambulâncias), Vampiro (fraude em licitação de hemoderivados) e a mais eloqüente, a operação Satiagraha (desvio de verbas públicas, lavagem de dinheiro, corrupção etc), e principalmente durante a sessão de julgamento de uma ação de Habeas Corpus autuada sob o n.º 91.952, em que foi anulada a decisão condenatória proferida pelo Tribunal do Júri da cidade de Laranjal Paulista (SP), pois, durante todo o julgamento o acusado permaneceu algemado, embora seu Defensor protestasse contra o excesso, explica-se: no entender do Supremo a colocação desnecessária de algemas viola o princípio da dignidade humana, e no caso específico gerava mesmo que de maneira indireta, uma presunção de culpa contra o acusado, e essa sensação atingira o Conselho de Sentença, vez que viciava a livre vontade dos jurados.

Assim, diante dessa situação constrangedora, o ministro Marco Aurélio bradou: “Manter o acusado em audiência, com algema, sem que demonstrada, ante práticas anteriores, a periculosidade, significa colocar a defesa, antecipadamente, em patamar inferior, não bastasse a situação de todo degradente”, outrossim, Marco Aurélio aduziu que “o julgamento de júri é feito por pessoas leigas, que ao verem o réu algemado podem imaginar que ele é perigoso”.
Já quando da sessão plenária que definiria o teor da 11.ª súmula vinculante, o presidente da suprema corte de justiça, ministro Gilmar Mendes disse que a súmula tem basicamente o objetivo de evitar o “uso de algemas para exposição pública do preso”, e que “a Corte jamais validou esta prática, que viola a presunção da inocência e o princípio da dignidade humana”, e de que o objetivo, muitas vezes", é algemar e colocar na TV”.
II.Mas, o que é Súmula Vinculante?
Súmula é a síntese de um entendimento jurisprudencial extraída de repetidas decisões num único sentido, assim, o STF por diversas e reiteradas vezes decidiu que o uso desnecessário de algemas viola princípios constitucionais, entre os quais, o da dignidade, pois, expõe o detido à ilegítimo constrangimento.

Outrossim, diz-se vinculante em razão de obrigar todos os agentes públicos (no caso, juízes e policiais) ao seu fiel cumprimento, pois, caso esses agentes a desrespeite, ficarão sujeitos a diversos processos: administrativo (sanção disciplinar), civil (indenização) e criminal (abuso de autoridade), além de ensejar a responsabilidade objetiva do Estado na indenização por eventual dano moral.

Insta ressaltar que a súmula vincula, ou seja, obriga o Judiciário (juízes, desembargadores e ministros), bem como a Administração Pública direta ou indireta nos três níveis (federal, estadual e municipal) ao seu exato cumprimento, contudo, ela não obriga o Poder Legislativo em suas funções típicas, assim, pode esse Poder mediante Lei ou Emenda Constitucional, aprovar um texto que contrarie o teor da vinculante súmula.

Oportuno afirmar que o próprio Supremo, de ofício, ou mediante provocação dos legitimados, pode rever ou mesmo cancelar qualquer súmula vinculante. 

III. Conteúdo sumular

Outro aspecto muito importante a ser observado está contido na nova Súmula, isto é, se não houver risco de fuga ou não ocorrer risco à integridade do agente público ou de terceiros, a prisão efetivada será passível de nulidade, ou seja, a pessoa injustamente vilipendiada em seus direitos deverá ser posta em liberdade imediatamente, portanto, ao cumprir o mandado prisional ou mesmo ao efetuar uma prisão em flagrante delito, deverá o agente responsável observar o enunciado vinculante, e assim, se o detido não ensejar riscos (agressão ou fuga), de maneira alguma haverá direito de algemá-lo.

Frise-se que a edição da aludida Súmula Vinculante, teve votação unânime de todos os componentes da excelsa corte, ou seja, 11 ministros resolveram dar um basta nas reiteradas espetacularizações das prisões midiáticas, como muito disse o Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Cezar Britto, ademais, surge na população o entendimento de que, caso não se algeme o agente, no futuro não haverá punição, e de outro lado o seguinte conformismo: “pelo menos saiu algemado, embora será absolvido”, entretanto, o fato de se algemar alguém, não enseja sentenças condenatória ou absolutória.

Deve-se lembrar, que via de regra, o criminoso do “colarinho branco” não oferece risco quando de sua prisão, todavia, na baixa criminalidade (seqüestradores, traficantes etc), o risco é evidenciado pela atitude tomada por esses criminosos, portanto, não se algema quem é pobre ou rico, e sim àquele cuja necessidade é imperiosa.

Por fim, ressalte-se que a colocação de algemas não representa o fim da impunidade, vez que essa ocorre (muitas vezes) por deficiência das provas colhidas, ou mesmo na ilicitude da sua obtenção.

Conclusão: a Sumula Vinculante 11, não impede a colocação de algemas, apenas regula as regras que validam sua imposição, respeitando princípios constitucionais.
É o que há.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

POLÍCIA - "PRIMEIRO PRENDER....DEPOIS INVESTIGAR!"

EXISTE A PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA??!!!

Análise e visão crítica conforme o Estado Constitucional e Humanitário de Direito


I. Síntese Histórica
A lei sobre  a Prisão Provisória teve origem a partir da edição da Medida Provisória n.º 111 de 24 de novembro de 1989, que foi convertida no Projeto de Lei de conversão n.º 039/89, aprovado em seguida, tranformou-se na Lei 7.960 de 21 de dezembro de 1989.
Foi, assim, enviada ao Parlamento pelo então presidente da República, José Sarney, com a finalidade de coibir os abusos praticados com a denominada “prisão para averiguação”, e bem como para auxiliar a Autoridade Policial (Delegados de Polícia) no estabelecimento de autoria e materialidade em razão da prática de delitos graves v.g., roubo, homicídio simples, etc., (veja-se que a aludida lei não se aplica somente aos delitos hediondos).
Bom é lembrar que a prisão temporária já fora aventada por força do projeto de Lei n.º 1.655 do ano de 1983, cuja finalidade era evitar desnecessárias prisões preventivas, e a Medida Provisória em questão seria o seu “reflexo no espelho”, isto é, uma cópia (note-se que o Projeto é anterior à Carta Constitucional promulgada em 05 de outubro de 1988).
Defensores da validade e da necessidade da prisão temporária asseveram que tais medidas vigoram com perfeição em outros países, contudo, esquecem-se das diferenças existentes entre o Brasil e tais países (modelo social, sistema jurídico, bem como as particularidades de cada nação), contudo, essa discussão não faz parte do aqui tratado.
Em 11/12/89, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, protocolizou perante a Suprema Corte, a Medida Cautelar em Adin de n.º 162-1, requerendo a concessão de Medida Liminar objetivando a suspensão dos efeitos da MP originária da Lei em questão, sendo que, em 14 de dezembro daquele ano, a medida foi indeferida, tendo sido julgada prejudicada em 2 de agosto de 1993.
Todavia, em novembro de 2007, a Ordem dos Advogados do Brasil entendendo a inconstitucionalidade da lei da Prisão Temporária, autorizou seu Conselho Federal para tomar as medidas competentes, qual seja propor Ação Direta de Inconstitucionalidade (CF 103, VII) perante a Corte Suprema, com a finalidade de extirpar de nosso mundo jurídico a norma objeto deste artigo, ou seja, a Lei 7.960/89.

II. A Lei 7.960/89 está vigente; porém não possui eficácia jurídica Não é válida.
Ainda hoje é muito comum o operador do Direito, confundir e não diferenciar a vigência de uma lei com a sua validade (eficácia).
Para se atestar a validade de uma lei, basta observar sua compatibilidade com o quadro normativo constitucional e com o Direito Humanitário Internacional, ao passo que para verificar sua vigência, necessário ver se a mesma não foi revogada por outra lei. Ocorre que, nem toda lei vigente em um país, possui validade jurídica (abandona-se assim, o positivismo clássico), ou seja, para que possua eficácia jurídica, insta que a mesma possua compatibilidade vertical com a Carta Magna e com o Direito Humanitário internacional tanto no aspecto formal, quanto no aspecto material.
A lei em análise afronta a Constituição Federal e Tratados de Direitos Humanos no que tange aos aspectos matérias, pois, despreza Princípios, entre os quais, o da Presunção da Inocência e o do Devido Processo Legal, bem como o aspecto formal, vez que, não seguiu as regras orientadoras expressas no artigo 62 da Constituição da Republica Federativa do Brasil (conforme será detalhado nos tópicos 4 e 5 respectivamente).

III. Contestação dos requisitos autorizadores da prisão temporária: Uma Visão lógica e Garantista.
É fato comum e corriqueiro que diante de eventual dificuldade em se alcançar a autoria de um crime grave (seqüestro, v.g.) e suas provas, a Autoridade Policial e o agente Ministerial peticionarem ao Poder Judiciário rogando a decretação da prisão temporária contra o investigado/suspeito, invertendo-se, portanto, a lógica do devido processo, isto é, primeiramente o Estado prende um suspeito, e a partir daí, se inicia o procedimento investigatório.
Entretanto, os defensores dessa drástica medida assinalam que não haveria arbitrariedade em sua decretação, face haver o controle jurisdicional, ou seja, a segregação somente ocorreria mediante a verificação e a decretação pelo Poder Judiciário mediante solicitação das Autoridades Competentes.
Tal situação não deixa de ser positiva, porém, é de bom alvitre denotar que nem toda a decisão emanada do Poder Judiciário, só por si, representa inquestionável constitucionalidade, vez que a decisão deve estar pautada nos princípios que orientam a Carta Magna, e se tal regra não for obedecida, será irrelevante o “controle” realizado pelo Magistrado.
A lei que permite a prisão temporária do investigado ou suspeito da prática de um delito classificado como grave possui 3 (três) requisitos, contudo, ainda reina na doutrina dúvida sobre a alternatividade ou a cumulação desses requisitos, porém, a maioria dos estudiosos encampa a ocorrência de apenas dois requisitos, sendo obrigatório a presença do inciso de número III, bastando a união com o inciso I ou o inciso II.
Passo à análise desses.

I. Quando imprescindível para as  investigações do Inquérito policial.
Analisando esse primeiro requisito, como poderíamos saber o significado exato dessa imprescindibilidade (indispensabilidade)? É correto, prender alguém suspeito de uma conduta criminosa para que, com isso, possa o Estado tornar efetiva a investigação? Se assim agirmos, estaremos violando o preceito constitucional da presunção da inocência, pois, se há esse princípio, que impede a restrição ao jus libertatis, como o Estado pode prender alguém (para investigar), sabendo-se que a Constituição o presume inocente?
O correto, então, é (primeiramente) investigar e ocorrendo motivo para a decretação da prisão preventiva (cpp 312), a cautelar deve ser imposta.
Assim, se o suspeito praticar (efetivamente) condutas que possam prejudicar a apuração dos fatos, deve a Autoridade competente, pleitear ao Judiciário sua segregação provisória, devendo essa medida perdurar até que o Estado conclua a persecutio criminis, sempre respeitando a proibição da duração irrazoável do processo, conforme determina a CF, em seu artigo 5.º, LXXVIII, que proclama: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.
Outrossim, afirma-se que não se trata de “prisão para averiguação” e sim “prisão para investigação” aduzindo-se que a primeira, parte de pessoa indeterminada para se apurar fatos, de maneira aleatória, enquanto que a segunda, tem início a partir de um fato criminoso para uma pessoa determinada, como se isso fosse suficiente para dar ar de constitucionalidade a uma norma inconstitucional.
Nesse raciocínio, o Delegado não conseguindo fazer o seu ofício (apurar autoria e materialidade do delito), representaria pela prisão temporária do investigado, e num passe de mágica, tudo viria à tona!
Penso que a prisão temporária, é uma “resposta” do Estado (protetor) à opinião pública que clama por “justiça”, ou seja, é uma maneira (inconstitucional) de afirmar-se: “Calma, estamos punindo o delinqüente”.
Entretanto, também seria razoável vislumbrar o reconhecimento de que algumas Autoridades, infelizmente, não conseguem realizar seu ofício sem encarcerar o suspeito, ou dito de outra forma, só conseguem investigar esse suspeito, se ele encontrar-se preso, pois, solto seria impossível.
Sabe-se que muitos crimes possuem uma repercussão muito forte, seja pela maneira como foi perpetrado (requintes de múltiplas atrocidades), ou em razão da qualidade vítima (enfermidade, deficiência, idade tenra) e não há como negar que diante de um fato dessa dimensão, toda a sociedade (incluem-se os agentes da lei) ficaria revoltada e clamaria por uma resposta, isso é inconteste.
Ocorre que muitas vezes, o “faro” e o “tino” policial apontam a autoria de um delito para uma determinada pessoa, contudo, face o “crime perfeito”, não se consegue obter as provas necessárias para dar sustento a uma persecução criminal, e inconformados vislumbram a coerção da liberdade do suspeito como uma maneira de compeli-lo à confissão e na obtenção de provas, porém, essa situação vai de encontro ao ordenamento constitucional (princípio do devido processo legal, da presunção da inocência, etc), pois, se é verdade que grande parte das pessoas comuns, tolerariam tal situação, também é fato (inquestionável), que não gostariam de se passarem por suspeitas de um delito, e ter contra si, um mandado prisional.
Portanto, mediante essa situação, todos estariam repudiando a “prisão para averiguação”, e bradariam a execução dos ditames constitucionais e humanitários.
Concisamente, analiso algumas situações em que a coerção do suspeito, seria indispensável para o sucesso das investigações,mas que atos fundamentariam a segregação cautelar do suspeito? O interrogatório, a confissão? Ou seria para a colheita de exame pericial? Solto, o investigado dificultaria a quebra de sigilo telefônico, ou ele poderia inovar no processo?
Interrogatório do suspeito.
Poderiam os menos cultos afirmar que o suspeito/indiciado, embora devidamente intimado, não comparecera ao interrogatório, contudo, nesse caso, o Código de Processo Penal, permite a coercitiva condução, mediante ordem judicial (cpp 260), assim, Indispensável não seria a prisão, e sim e tão-somente a condução coercitiva para o ato, porém, sempre lembrando que o agente pode ficar inerte, isto é, ficar silente acerca dos questionamentos do fato. Diferente é a situação do suspeito que concretamente visasse uma fuga, pois, nessa situação, cabível a custódia preventiva, com a finalidade de assegurar a aplicação da lei penal, tudo conforme o cpp 312;
- Confissão, Reconstituição do Delito, Exames grafotécnicos, de sangue etc.
É totalmente desnecessário comentário mais profundo, vez que ninguém é obrigado a auto-incriminar-se, seguindo-se fielmente o princípio nemo tenetur se detegere, também inserido na Convenção Americana de Direitos Humanos, artigo 8.º, II, letra g.
De outro lado, ressalto a possibilidade de poder o suspeito inovar no processo (cp 347), ou até mesmo exercer coação no curso dele (cp 344) e neste caso, cometendo ilícitos penais, seria passível de uma captura legítima, ou poderia ser decretada sua prisão preventiva, nos termos de garantia da instrução criminal, ou seja, tudo poderia ser possível, menos a prisão temporária.
Em suma, para a lei em comento, faz-se necessário que sem a prisão do suspeito, a autoridade policial não consiga investigar, ou de outra forma, para que a autoridade policial possa investigar, é necessário o recolhimento do investigado, o que é uma monstruosidade lógica e jurídica.

II. Não ter o indiciado residência fixa ou não fornecer elementos para sua identificação.
O fato de o suspeito, não ter residência (fixa ou não), não pode ensejar (validar) a prisão temporária, pois, seria a aceitação do direito penal de autor (e não do fato), ou seja, o Estado estaria prendendo o suspeito, não em razão de seu ato, mas em razão do que ele é, ou de outra forma, um desfavorecido.
Imagine-se um crime de latrocínio, cujo suspeito seja um morador de rua, se fosse determinada sua prisão ( pelo fato de não ter moradia), já estaria o mesmo cumprindo antecipadamente uma sentença, que poderia nem mesmo ocorrer.
Já para a situação de o suspeito não fornecer elementos para sua identificação, bastaria aos agentes proceder a uma simples investigação, ad exemplum, ir ao local que o suspeito freqüentava, conversar com pessoas próximas, etc., lembrando-se que o mesmo não é obrigado a produzir prova contra si mesmo, portanto, não poderia ser obrigado a identificar-se, caso isso pudesse prejudicá-lo (embora haja polêmica nesse sentido)

III. Quando houver fundadas razões de autoria ou participação do indiciado em delitos tidos como graves.
Surge uma situação curiosa, a lei enumera diversos crimes, tidos como graves que autorizariam a decretação da prisão temporária, entre os quais, homicídio, estupro, sendo que tais delitos de acordo com dados estatísticos, via de regra, (proporcionalmente) são praticados por pessoas pertencentes às classes menos favorecidas social e economicamente, entretanto, o legislador olvidou-se de também inserir na aludida lei, alguns delitos graves, entre os quais os Crimes Contra o Sistema Financeiro ( Lei 7.492/86). Seria mero esquecimento?
O mais estranho, é que tais delitos, como regra, são cometidos por aqueles que detém uma parcela do poder, seja econômico, social, ou político.
Mas permitir uma prisão, mesmo que temporária, em razão de eventual gravidade do delito , é aceitar indisfarçavelmente, a recusa ao princípio da presunção de inocência (CF 5.º, LVII), pois, de acordo com posição consolidada do escólio jurisprudencial (principalmente do Supremo), bem como do magistério doutrinário, a gravidade de um delito, por si só, não é suficiente para corroborar o cerceamento cautelar do agente acusado da prática delituosa.
De outro modo, se autoridade policial já detém fundadas razões de autoria ou participação no delito grave, seria desnecessária a prisão temporária, vez que já estando firmada a materialidade e sua eventual autoria, não é lícito prender o suspeito com a finalidade de compeli-lo a dizer algo sobre o delito imputado, pois, é o Estado quem deve reunir elementos de provas (lícitas) e não o suspeito que deva fornece-las

3 - Vícios Formal ( de iniciativa) e Material( de objeto) da MP nº. 111/89 Inconstitucionalidade patente
Logo após a promulgação da Constituição Federal (05/10/1988) ecoou no país um “basta” advindo da sociedade, e principalmente da classe jurídica acerca das “prisões para averiguações”, surgindo posição do senhor Presidente da República à época (José Sarney) sobre a ilegalidade de tais prisões. Assim, sua Excelência enviou ao Congresso Nacional uma Medida Provisória (conforme CF 84, XXVI), que teria a finalidade de coibir odiosas prisões , bem como para subsidiar as Autoridades Policiais no esclarecimento de autoria e materialidade de crimes graves.
Portanto, o mandatário máximo da nação enviou ao Congresso Nacional a Medida Provisória n.º 111 de 24 de novembro de 1989, isto é, o Poder Executivo Federal legislou em matéria penal e processual penal criando também (pasmem) uma conduta típica inserida na Lei 4.895/65, a saber, a letra i do artigo 4º, que aduz constituir delito de abuso de autoridade, “prolongar a execução de prisão temporária, de pena, ou de medida de segurança, deixando de expedir em tempo oportuno ou de cumprir imediatamente ordem de liberdade”!
Posteriormente a aludida Medida Provisória foi aprovada pelo Parlamento que ignorou o contido no artigo 62, parágrafos 5.º e 9.º da CF, vez que desprezou os aspectos constitucionais da medida recebida, surgindo, então, a lei reguladora da Prisão Temporária, contudo, afirma-se que a medida provisória (embora possua força de lei), não é legítima espécie normativa, pois, inexiste processo legislativo para sua formação.
Outrossim, ressalte-se que qualquer espécie normativa que for editada com afronta ao processo legislativo, apresentará vício de inconstitucionalidade
Portanto, essa lei é inconstitucional, vez que possui vícios insanáveis:
1.º) formal (inconstitucionalidade nomodinâmica), isto é, impedimento ao presidente legislar por meio de medida provisória sobre direito penal e processual penal;
2.º) material (inconstitucionalidade nomoestática), pois, matérias atinentes a direito penal e processual penal, não podem ser elaboradas a partir de medida provisória, e sim somente de lei, isto é, aquela originária de projeto de lei.
A constatação é de fácil percepção, bastando apenas ler (e respeitar) o contido no artigo 62 da Constituição da República que assevera ser permitido ao mandatário máximo da nação editar Medidas Provisórias em matérias que exijam relevância e urgência, entretanto, a própria Carta Constitucional, em seu parágrafo primeiro, nitidamente, estabelece proibições em alguns temas, e entre esses, há a vedação imposta ao Executivo, impedindo-o de editar medidas provisórias sobre matéria de direito penal e processual penal ( CF 62, parágrafo primeiro, inciso I, letra b), ou seja, a aludida MP n.º 111, que originou a Lei 7.960/89 (Prisão Temporária) é inteiramente Inconstitucional, independentemente da aprovação feita pelo Congresso Nacional.
Quer-se dizer que existem limites materiais à edição de medidas provisórias, isto é, o Presidente da República está (constitucionalmente) proibido de editar matérias que versem sobre o direito penal e processo penal, e que o legislador constituinte tornou indelegáveis essas matérias ao Poder Executivo, ou seja, somente o Legislativo federal possui competência para tratar dessas matérias.
Isso significa dizer que os Delegados não deveriam representar, e o Ministério público não deveria requerer ao Poder Judiciário a decretação da Prisão Provisória contra quem quer que seja, mesmo que o investigado ou suspeito, cometesse uma série de hediondos delitos (tráfico, latrocínio, homicídios qualificados etc), e de outro vértice o Juiz, ao se deparar com uma petição nesse sentido, simplesmente, deveria rejeitá-la, alegando Inconstitucionalidade da Lei que permite a prisão temporária.
Mas então, se a nossa constituição é clara ao vedar a edição de medidas provisória acerca de temas de direito penal e processual penal, qual seria o motivo (jurídico) que fazem com que nossas autoridades aceitem tamanha inconstitucionalidade? Difícil a resposta.
Não bastasse os argumentos acima nominados, encontramos, enfim, a última razão para invocar a ilegitimidade da Lei 7.960/89, face outro Princípio, claramente escrito em nossa Constitucional, o do Devido Processo Legal Processual Penal, que apresenta diversas dimensões de garantia, entre as quais destacamos:
a) Lex Scripta Nulla coatio sine lege O justo processo advém de lei. E esta tem que ser escrita;
b) Lex Populli A norma válida para o justo processo penal advém somente de Lei, isto é, ato normativo aprovado pelo Congresso Nacional (Medida provisória não é originária do Parlamento) e esta garantia está registrada em nossa Carta Magna, artigo 5.º, LIV que aduz : “ninguém será privado da liberdade, ou de seus bens sem o devido processo lega”, sendo essa garantia reforçada pelo artigo 62, parágrafo primeiro, letra b da CR (proibição de Medida Provisória sobre matéria penal e processual penal).
Quando se fala em devido processo legal, temos que dar-lhe um sentido amplo, envolvendo além dos procedimentos judiciais e inquisitoriais, o processo legislativo, pois, somente mediante lei discutida pelos representantes do povo, é que se obtém um legítimo e devido processo legal.

4- Da Inconstitucionalidade da prisão Temporária face Os Tratados de Direitos Humanos
Os Tratados Internacionais sobre Direitos Humanos, face o voto do Ministro Celso de Mello no Pleno do STF, em razão do Habeas Corpus nº. 87.585 e Recurso Extraordinário nº. 466.343, possuem valor constitucional não resta dúvida.
O Brasil, é signatário desses tratados (Convenção Americana de Direito Humanos e do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos), assim, de acordo com o Supremo, possuem hierarquia normativa superior às leis ordinárias (ad exemplum, a lei 7.960/89 que trata da Prisão Temporária) e disso tudo, podemos (e devemos) concluir que essa Lei (advinda de uma Medida Provisória), está em confronto com o contido no artigo 7.º, n.º 2 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San Jose da Costa Rica), que assinala a todas pessoas, o direito à liberdade, proibindo, que alguém seja privado de sua liberdade física, a não ser “pelas causas e condições previamente fixadas pelas condições políticas dos Estados-Partes, ou pelas leis de acordo com ela promulgada”, portanto, é fácil concluir que as condições políticas dos Estados-Partes, foram violadas, pois, a Constituição proíbe expressamente a edição de medidas provisórias sobre direito penal e processual penal, e a lei em comento, teve sua origem na dita medida provisória, e outrossim, O Pacto de San José da Costa Rica, assevera, que a restrição da liberdade de alguém, origina-se somente por meio de lei, e nunca mediante medida provisória, independentemente de ela ser aprovada pelo Congresso Nacional.
Aguardamos agora o resultado da medida a ser tomada pelo Conselho Federal da OAB por meio da competente medida jurídica (ADI) que visa assegurar a eficácia e o respeito aos direitos e garantias individuais estabelecidos nos Tratados assinados e ratificados pelo Brasil, e os constantes em nossa Carta Republicana.
Essas, então, são as razões em que se afirma, com convicção: A Prisão Temporária é inconstitucional.
Em tempo: No Estado Constitucional Democrático e Humanitário de Direito, o respeito aos Princípios Constitucionais deve ser observado por todos, inclusive pelas Autoridades em todos os níveis
É o que há.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

PRESENÇA DO RÉU NO JULGAMENTO: FIM DA OBRIGATORIEDADE

RÉU VAI AO  SEU JULGAMENTO SE QUISER!
Importante a reforma processual acerca da aplicação da Lei 11.689/08, que trata da possibilidade de ocorrer o julgamento do acusado da prática de crime doloso (com intenção) contra a vida (aborto, auxílio ao suicídio e homicídio), quando intimado, não comparecer à sala do Tribunal do Júri.
Antes da vigência da novel legislação,  o julgamento não ocorreria  se o acusado da prática de um homicídio não comparecesse na sessão de julgamento, sendo que o magistrado poderia decretar a prisão preventiva. Contudo, muitas vezes, o agente do crime já estava foragido,  e a conseqüência prática seria a prescrição do delito.
A nova previsão tem assento constitucional, pois, se o acusado tem o direito de permanecer em silêncio, sua recusa em comparecer à sessão de julgamento caracteriza lídima expressão desse direito. Não é dever do acusado comparecer ao próprio julgamento, e sim, uma faculdade (um direito subjetivo) em exercitar ou não a sua autodefesa (ficar em silêncio, falar o que lhe for conveniente ou mesmo mentir).
Ademais, conforme inserido no Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, possui o acusado da prática de qualquer delito (seja leve ou grave), a garantia de estar presente ao julgamento e defender-se pessoalmente (autodefesa) caso assim julgue ser pertinente. A nova legislação vai ao encontro do inserido nos pactos internacionais assumidos pelo Brasil, pois é muito estranho, o réu ser obrigado a comparecer ao seu julgamento. Assim, antes da vigência da lei em questão, a impunidade restava clara, gerando um descrédito acerca da aplicação do direito penal a quem fosse acusado de crime doloso contra a vida.
De outro vértice, é dever do (bom) profissional do direito orientar seu cliente sobre as conseqüências do processo penal legal, advertindo-o sobre todas as conseqüências de cada ato externado; quando indagado sobre os efeitos da recusa daquele em comparecer ao seu julgamento, é seu dever explicar que, antes da nova lei, o julgamento não ocorreria sem sua presença física, assim, a responsabilidade e o atraso no julgamento com a eventual impunidade não poderiam ser imputados ao cliente (direito à plenitude de defesa), nem tampouco ao advogado (que simplesmente cumpria o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil), mas sim à enorme deficiência da legislação processual penal, que proibia que ocorresse o julgamento de um homicídio, caso o réu (intimado) não comparecesse ao dia e hora designados para a sessão do julgamento pelo Tribunal do Júri.
Em suma, face à nova lei, respeita-se o direito do acusado (que vai à sessão de julgamento se quiser) e respeita-se a aplicação do devido processo legal, submetendo o réu a julgamento pelos seus pares, seja condenado-o ou absolvendo-o, pois o importante e essencial na democracia jurídica é o fiel cumprimento do mandamento jurídico constitucional e humanitário de direito.
É o que há.
EM TEMPO: Frise-se que, embora não expressamente previsto na nova lei, o julgamento deverá ser adiado, caso haja um motivo razoável ao não comparecimento, como no caso de uma enfermidade

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

LEI SECA: TRIBUNAIS ABSOLVEM POR FALTA DE PROVAS.

Era o esperado!!
Desde a entrada em vigor da denominada Lei Seca, muitas autoridades (diga-se as políticas), divulgaram com extremo alarde que a nova lei de trânsito iria concretamente punir criminalmente os motoristas flagrados em condições de embriaguez, foi dito que a nova legislação seria “muito mais severa”, e também que aparelhos medidores de dosagem alcoólicas, os “bafômetros”, estariam à disposição do aparato policial para efetivamente recolher em cárcere irresponsáveis condutores.
Muitas entrevistas, muito discurso, enfim muita demagogia (como de costume) desfilaram nos meios de comunicação fazendo crer que, a partir da nova legislação, tudo seria diferente.
E foi!
Escrevi diversos artigos onde havia alertado de que as alterações legislativas iriam “premiar” a todos os motoristas que flagrados embriagados ao volante, recusasem-se à submissão ao teste de alcoolemia, tendo-se em vista que a nova legislação exigia uma determinada quantia de álcool por litro de sangue no motorista.
Ocorre que, acima da lei prevalecem institutos de Direito Penal, entre os quais, aquele que todos conhecem, desde os mais humildes até os mais letrados, (com exceção, claro, de diversos parlamentares!), qual seja: “ninguém é obrigado a produzir prova que possa prejudicá-lo”, e como a lei prevê uma quantidade de álcool no sangue, a única maneira de se provar (juridicamente) a constatação da embriaguez seria apenas mediante a utilização dos bafômetros (ou o exame de sangue).
Contudo, o cidadão brasileiro ciente de seus direitos assegurados na Constituição e inclusive em pactos internacionais, optou em não ser submetido aos exames de alcoolemia.
Resultado: de acordo com levantamento realizado por um criminalista paulista (Professor Aldo de Campos Costa) entre os meses de junho de 2008 a maio de 2009 nas Justiças estaduais do Brasil, 80% dos motoristas que se recusaram à submissão ao teste do bafômetro, ou ao exame de sangue, para a comprovação de embriaguez, restaram absolvidos por falta de provas (in dubio pro reo).
Frise-se, que não existe o menor questionamento acerca do princípio perante nossa Corte Constitucional, o Supremo Tribunal Federal.
A lei anterior na área criminal, sim, era mais coesa, pois, não previa nenhuma dosagem de álcool no sangue, isto é, bastava a simples comprovação da embriaguez mediante a declaração de testemunhas idôneas, mais a direção anormal.
Atualmente, como profissional da área (afirmo isso em palestras ou mesmo em faculdades), que caso um motorista seja flagrado dirigindo anormalmente e que tenha em seu sangue quantia de álcool no sangue em dosagem acima da permitida, nem mesmo poderá ser conduzido à delegacia, e nem tampouco poderá ser indiciado por embriaguez, caso se oponha aos exames, vez que para se instaurar um procedimento penal, é necessário a comprovação da materialidade do delito (constatação da dosagem de álcool), assim, caso haja a recusa, como é que o Estado vai instaurar um inquérito (quem dirá uma ação penal), se não há o requisito indispensável exigido pela lei, isto é, a materialidade delitiva?
Obrigado congressistas, realmente os senhores fizeram uma lei que ajuda pelo menos uma parcela da população: os irresponsáveis motoristas bêbados, que resolverem exercer um direito assegurado legalmente!
Em tempo: o caso do deputado paranaense pode ser comprovado por testemunhas, vez que se trata de delito de homicídio doloso com a morte de duas pessoas, e não de embriaguez ao volante.
É o que há.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

VADIAGEM NÃO CONSTITUI INFRAÇÃO PENAL!

Vadiar pode ser imoral...nunca um contravenção penal
Mais um fato inusitado toma parte do cenário jurídico-policial em nosso País, dessa vez a cidade de Assis no interior de São Paulo foi destaque nos principais meios informativos, em razão de um programa de combate à criminalidade denominado “política de tolerância zero”. A polícia daquele município resolveu “encaminhar” ao distrito policial, pessoas que, ao serem abordadas pelos agentes da lei, não tenham ocupação laboral, desde que aptas, ou seja, estariam praticando a contravenção penal titulada como “vadiagem” nos termos da Lei de Contravenções Penais.
Preliminarmente, é bom afirmar que a aludida norma penal encontra-se em plena vigência, todavia, asseveramos que mesmo uma norma encontrando-se vigente, é passível de ser declarada sem efeito (sem eficácia jurídica), portanto, deve ser desprezada por todos, principalmente pelo Poder Público, e para que a ineficácia ocorra, basta que viole princípios de Direito Penal: que é o caso da contravenção de “vadiagem.”

A lei cria uma presunção de que aquele que não possui ocupação lícita e não tenha meios de subsistência, irá praticar delitos, isto é, uma presunção legal de periculosidade do agente, assim, pune-se pelo que o agente é (“vadio”), e não pelo que ele efetivamente faz (ou deixa de fazer), é o denominado Direito Penal do Autor (pune-se pelo fato de se ser), numa violação ao Direito Penal do Fato (pune-se pelo ato praticado), tal instituto faz-nos relembrar o Direito Penal Nazista (inclusive tudo estava descrito em lei!), que punia o cidadão pelo que ele “era’ (judeu, negro, prostituta), e não pelo que ele supostamente havia feito, violando-se assim, o Princípio da Dignidade da pessoa humana.

Oras, não trabalhar e viver de ajuda pode ser uma opção pessoal do ser humano que prefere a inatividade, mas de maneira alguma deve ser responsabilizado criminalmente por tal conduta, que eventualmente pode ser tida com imoral, porém, o Direito Penal não é dado a intervir em questões morais, ideológicas etc (Princípio da Intervenção mínima), então, a atitude do ocioso, no máximo, poderia ser tida como inoportuna, nada além disso. Bom é lembrar que trabalhadores também cometem hediondos delitos (crimes de sonegação fiscal, lavagem de dinheiro etc).
Ser vadio ou ocioso é parte da liberdade de expressão do ser humano, manifestando a sua personalidade, quadro integrante à sua intimidade, assim, ser ocioso tendo rendimentos, é lícito, porém, caso não os tenha, cometerá infração penal, ou melhor, será vadio.
Em suma, os transgressores da ordem social, seriam as pessoas aptas ao trabalho e sem recursos para sua sobrevivência (pobres), já pessoas com renda econômica (ainda que de trabalho alheio), nunca cometeriam tal delito, ou seja, os abastados continuariam livres, mas, os miseráveis, ou aqueles que optaram por tal estilo de vida.
É o que há.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

NO BRASIL, É MAIS GRAVE PEDIR PROPINA DO QUE EXIGI-LA!!!

É inconstitucional pena máxima dos crimes de corrupção

A idéia principal deste artigo, não é de pura e simplesmente tecer críticas à voracidade legiferante de nossos legisladores, mas sim a de pluralizar o debate acerca da aplicação do Princípio da Proporcionalidade e Razoabilidade aos intérpretes da norma (juízes, promotores, advogados etc), quando o Congressista olvidar-se da limitação Constitucional ao ius puniendi.
É que a Lei 10.763/2003 aumentou o limite máximo em abstrato dos delitos de Corrupção Ativa e Corrupção Passiva (CP 317 e CP 333, respectivamente), estabelecendo o quantum em 12 anos de reclusão, tentando com isso, resguardar ainda mais o objeto jurídico desses delitos, isto é, o normal funcionamento, a transparência e o prestígio da Administração Pública. Aparentemente esse aumento (de 8 anos para 12 anos de reclusão) seria constitucional, repita-se, aparentemente.
Assim, para a perfeita compreensão do tema em análise faz-se necessária uma atenta observação à cominação inserida no artigo 316 do diploma repressivo, que trata do delito de Concussão, cuja pena é de reclusão de 2 a 8 anos, acrescido de multa. Com essa tipificação penal, visa-se a tutela do normal funcionamento e o prestígio da Administração Pública, assim, como nos delitos de corrupção ativa e passiva.
O núcleo principal do tipo da Concussão é a conduta praticada por funcionário público (mesmo que ainda não tenha assumido o cargo, porém, desde que aja em razão dele), de exigir indevida vantagem mesmo que para terceiro, sendo uma forma especial de extorsão praticada pelo agente público, onde o mesmo faz prevalecer sua posição funcional em detrimento da Administração Pública e do particular lesado.
Pelo verbo do tipo denota-se que o infrator não pede, e nem solicita, mas sim exige do particular, a indevida vantagem, assim, a título exemplificativo, cita-se o fato de médico credenciado ao SUS (Sistema Único de Saúde), que para a realização de imperiosa cirurgia exige indevidamente determinada quantia do segurado, para que proceda à medida clínica.
De outro lado, analisando-se os tipos penais que tiveram o incremento no limite máximo em abstrato, vê-se que os verbos principais do crime de Corrupção Passiva (CP 317), são as condutas de solicitar, receber ou aceitar vantagem indevida, ou promessa de tal vantagem (situação essa aplicável ao funcionário público, ainda que fora da função), ao passo que na Corrupção Ativa (CP 333) o particular em especial, oferece ou faz promessa de vantagem indevida a funcionário público, com intuito de obter a prática, omissão, ou atraso de ato de ofício.
Como exemplo desses dois delitos, pode-se citar o caso do médico, que sutilmente, solicita vantagem indevida ao paciente segurado do SUS, para a realização de uma cirurgia, e a situação do próprio segurado que oferece quantia indevida ao médico para que ele realize um procedimento cirúrgico em prejuízo dos demais que aguardam na fila de espera.
Denota-se que é muito mais reprovável a conduta de quem exige vantagem indevida, do que a conduta de oferecer ou aceitar receber uma indevida vantagem, não há a menor dúvida sobre essa situação lógica e fática, contudo, para espanto de todos, o legislador pune com mais severidade os delitos de Corrupção (Ativa ou Passiva), em relação ao delito de Concussão: corrupção – pena de até 12 anos de reclusão; concussão – pena até 8 anos se reclusão!
Ora, simplesmente não há a menor proporção na relação conduta/delito/pena aos crimes enunciados alhures, não há razão para punir com maior severidade quem pratica conduta de menor lesividade, sendo isso ilógico e irracional. Portanto, o Princípio da Proporcionalidade deve (também) ser respeitado pelo legislador, e caso assim não aconteça o juiz (liberto do positivismo jurídico) deve no processo em que atuar, declarar incidentalmente a inconstitucionalidade dos preceito sancionadores desses dois delitos, vez que há nítida desproporção na imposição de pena, faltando o indispensável equilíbrio na medida aflitiva.
Luiz Flávio Gomes em escólio doutrinário assevera:
"Tanto o legislador como o juiz, acham-se limitados pelo princípio da proporcionalidade. E sempre que o legislador não cumpre o princípio, deve o juiz fazer os devidos ajustes", e prossegue aduzindo a seguinte situação: "Pena de seis anos para um beijo lascivo (CP, art. 214): cuida-se de pena totalmente desproporcional. Cabe ao juiz refutar sua aplicação. A solução melhor, para o caso, é a aplicação da pena anterior à lei dos crimes hediondos para o caso do beijo".(Direito Penal, Parte Geral, Ed. RT, 2003, p.115)
Gilmar Mendes, presidente da Excelsa Corte Constitucional tece os seguintes comentários sobre a relevância da hermenêutica do Princípio da Proporcionalidade:
"Por outro lado, afirma-se de maneira inequívoca a possibilidade de se declarar a inconstitucionalidade da lei em caso de sua dispensabilidade (inexigibilidade), inadequação (falta de utilidade para o fim perseguido) ou de ausência de razoabilidade em sentido estrito (desproporção entre o objetivo perseguido e o ônus imposto ao atingido). Vê-se que o princípio da proporcionalidade ou da proibição do excesso é plenamente compatível com a ordem constitucional brasileira".(Controle de Constitucionalidade: aspectos jurídicos e políticos, ed. Saraiva, p. 396).
Infelizmente, existem outras situações ilógicas em nosso Código Penal, basta lermos o contido nos preceitos secundários do delito de Receptação, cp 180 (caput), com a sua figura qualificada (parágrafo primeiro):
180 Caput: “Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte.”

Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
Parágrafo 1º: “Adquirir, receber, transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar, vender, expor à venda, ou de qualquer forma utilizar, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, coisa que deve saber ser produto de crime."
Pena – reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa.
Pune-se a figura do caput por meio do dolo direto (“que sabe ser”), sendo o delito afiançável, e aplicável eventual suspensão condicional do processo (“sursis processual”), conforme artigo 89, da Lei 9.099/95, contudo, a figura qualificada, que é punida por meio do dolo eventual (“deve saber”), é mais severamente punida (pena de 3 a 8 anos), sendo incabível o arbitramento de fiança, bem como o “sursis processual”.
Mas, então, qual é a razão lógica ou jurídica que fez o legislador estabelecer uma pena mais gravosa para a receptação qualificada (parágrafo 1º), quando o agente atua com dolo eventual, em relação à figura do caput, em que o agente atua com dolo direto? Em suma, face o contido na lei penal, se o agente (comerciante) devia saber (dolo eventual) que a res era produto de crime, será punido mais rigidamente, e se sabia (dolo direto) a sua punição será bem menos gravosa!
Felizmente essa inusitada situação foi alvo de decisão pela Excelsa Corte, HC 92.525, tendo o ministro relator Celso de Mello asseverado:
O preceito secundário do parágrafo primeiro deve ser desconsiderado, uma vez que ofende os princípios constitucionais da proporcionalidade e da individualização legal da pena”, e prossegue: “A imposição de pena maior ao fato de menor gravidade é inconstitucional, desrespeitando os princípios da harmonia e da proporcionalidade”.
Como se deduz, o legislador ao elaborar a norma penal incriminadora não pode e não deve desrespeitar os preceitos constitucionais, deve sim, observar o parâmetro da Razoabilidade ou Proporcionalidade, sob pena de invalidação da mesma, pois, não é lícito a ninguém agir sem moderação, e neste termos, o respeito à proporcionalidade constitui limitação material à conduta legislativa dos agentes públicos.
Concluindo acerca da maior punição em relação a delitos menos graves (corrupção), tem-se que o magistrado ao sentenciar deve aplicar o Princípio da Proporcionalidade, cortando os excessos, isto é, as penas desses delitos não podem ultrapassar as quantificadas pelo delito de Concussão, qual seja, o limite de 8 anos de reclusão deve ser observado para os delitos de Corrupção Ativa e Passiva.

É o que há.

AUTORIDADES TEM DIREITO AO DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO?

Prefeito condenado criminalmente, pode apelar da decisão?
Imagine o prezado leitor as seguintes hipóteses. Primeira: um escriturário é condenado (injustamente) pela pratica de um furto. Segundo: uma autoridade que goze de foro por prerrogativa de função é condenado (indevidamente) em razão de um peculato.
Assim, nessa situação ao escriturário seria possível ajuizar um recurso que pudesse rever o mérito da decisão prolatada, pois, nos termos do CPP 593, cabe apelação contra sentença proferida por juiz singular, ao passo que para o alcaide, o inconformismo jurídico acerca de questões fáticas seria impossível, vez que não há previsão legal de recurso de apelação contra decisão proferida por um órgão colegiado, lembrando que a autoridade em questão é julgada pelo respectivo Tribunal competente
(CF 29, Inciso X).
Assim surgem os seguintes questionamentos: Se estamos sob a égide de um regime Constitucional, Democrático e Humanitário de Direito, haveria razões a justificar essa situação que não prevê acesso à garantia do duplo grau de jurisdição aos detentores de foro por prerrogativa funcional? Como assegurar a eficácia do princípio da ampla defesa e da isonomia a essas autoridades? A impossibilidade recursal não viola o devido processo legal garantido constitucionalmente?
Desse modo, fica evidenciado uma ilegítima restrição ou mitigação ao princípio do duplo grau de jurisdição no cenário jurídico brasileiro ao agente público que gozar de foro por prerrogativa de função.


Fundamentos dos recursos
De outro vértice, existem, pelo menos, três hipóteses fáticas a justificar a previsão de recursos no sistema processual penal de um país que segue as regras de uma Justiça Penal Principiológica:
a) Falibilidade humana; b) Inconformismo (natural) do sucumbente; c) Evitar atos ilícitos e arbitrariedade do julgador.
Portanto, regra geral, aquele que sentir-se prejudicado por ocasião da derrota em uma demanda, terá à sua disposição um meio jurídico que permitirá o reexame fático e de direito da decisão combatida, pois, é natural que (também) um réu que goze de foro por prerrogativa de função, sinta-se inconformado (não importa o motivo) com a insatisfatória decisão condenatória, e assim, manifeste lídimo anseio de ter a garantia e o direito de revisão de uma decisão contrária, aos seus interesses.
Não se vê nenhum argumento lógico e racional para limitar importante direito ao detentor de foro “especial”, pois, este também pode ser vítima de um erro judiciário ou eventual arbitrariedade do Colegiado prolator do acórdão condenatório.


Assevera-se que o fato de o agente público ser julgado por um órgão colegiado, já seria uma justa razão ao impedimento de manifestação recursal sobre os aspectos fáticos da decisão, contudo, esse argumento não convence, pois, tal situação não possui o condão de elidir um direito consagrado em nossa Constituição, artigo 5º, Inciso LIV, porque “ninguém será privado da liberdade, sem o devido processo legal”.

Veja-se o absurdo jurídico: Em caso de condenação face uma lesão corporal culposa cometida contra um homem (1), cuja pena não ultrapassa um ano de detenção, um réu “comum”, poderia apelar com o intuito de rever a condenação, levando seu inconformismo a juízes do mesmo nível (Turma Recursal), entretanto, em caso de um delito de maior gravidade (Lavagem de Capitais e.g.), o agente público detentor de foro funcional, não teria o mesmo direito (em relação ao aspecto fático), ou seja, para um delito de menor potencial ofensivo (onde a ofensa ao bem jurídico não é tão relevante) opera-se o princípio do duplo grau e da ampla defesa, mas, para um delito de maior ofensividade e repercussão jurídica e social, tal garantia estaria negada!

Mas então como solucionar tal problema?
Simples, nada impede que em situações como a apresentada, o detentor de foro especial seja julgado e processado por uma Turma ou Câmara do Tribunal respectivo, e seu eventual inconformismo quanto ao mérito, seja apreciado para um Órgão Especial ou o Plenário do mesmo Tribunal prolator do acórdão condenatório.
Regramento principiológico recursal
O princípio do duplo grau de jurisdição, fundamenta o recurso interposto pela parte sucumbente em matéria penal, havendo expressa previsão na Convenção Americana de Direitos Humanos — Pacto de San José da Costa Rica — que assegura ao condenado o “Direito de recorrer da sentença para juiz ou tribunal” (grifo pessoal), note-se a ausência de restrição ou limitação a quem quer que seja o condenado pela decisão judicial.
A Constituição Federal, em cláusula pétrea, assevera em seu artigo 5º, parágrafo 2º que: “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte” (grifo pessoal), portanto o Pacto de San José constitui ao lado da Lei Magna, fonte de direito processual penal, contando com força de norma constitucionalizada (2).
A Conseqüência de ordem prática é acalentadora, pois, os Tratados de Direitos Humanos (Pacto de San José, ad exemplum) não restringem os direitos e as garantias previstos na Constituição Federal (CF 5, par. 2º), ao contrário, amplia-os, e de outro lado, apenas a título de esclarecimento, se um tratado de direitos humanos, restringir ou eliminar um direito ou uma garantia inserta na Carta Magna, ficará sem efeito.
Em suma: aplica-se sempre a norma que mais for favorável ao acusado (Pro Homine)
O Pacto de San José da Costa Rica foi aprovado pelo Congresso Nacional (Decreto Legislativo 27, de 25 de setembro de 1992), tendo o Brasil depositado sua Carta de Adesão, em 25 de setembro de 1992, tornando-se parte do nosso regramento jurídico em 06 de novembro de 1992, face o Decreto 678, assim, necessário é concluir que o direito ao segundo grau de jurisdição (recurso de mérito), expressamente previsto no aludido pacto, encontra-se inserido em nosso ordenamento jurídico de maneira constitucionalizada, isto é, nenhuma norma jurídica pode negar-lhe aplicabilidade, e mesmo que por meio de uma Emenda Constitucional tente-se suprimir tal garantia, essa Emenda nem poderá ser apreciada pelo Congresso Nacional.
É que o Princípio do Duplo Grau (CF 5º, parágrafo 2º, c/c artigo 8º, 2, g, do Pacto de San José, com o novo posicionamento da Excelsa Corte), é cláusula intangível, pois, é um direito e uma garantia individual a todos os jurisdicionados, sem exceção, não importando se o acusado é uma pessoa do povo, ou uma alta autoridade (prefeito, governador etc), e assim não poderá ser objeto de deliberação pelo Parlamento, conforme artigo 60, parágrafo 4º, Inciso, IV.
Para corroborar o aqui defendido a Convenção de Viena em seu artigo 27 prevê que “Nenhum Estado que faz parte de algum tratado pode deixar de cumpri-lo invocando um Direito Interno”.
Portanto, o direito a um recurso que reveja toda a matéria (fática e de direito) está a proteger todos os jurisdicionados, restando claro a possibilidade jurídica de que qualquer jurisdicionado pode levar ao conhecimento de outra autoridade judiciária competente, seu inconformismo, visando a reparação e eventual error in judicando, dando plena eficácia ao princípio da Dignidade Humana.Outro argumento que fundamentaria a negativa de um recurso acerca do mérito é aquele que afirma que o duplo grau impõe necessariamente uma jurisdição inferior e outra superior. Sim, isso não deixa de ser aceitável, contudo, devemos observar que nos delitos de menor potencial ofensivo (Lei 9.099/95) o recurso de apelação também é julgado por juízes de mesma hierarquia, isto é, pela Turma Recursal, conforme artigo 82 da Lei dos Juizados.

É o que há.

Notas de rodapé
1- Propositadamente não foi mencionada como vítima uma mulher, face o disposto no artigo 41 da Lei 11.340/06 (Lei Maria da penha), que determina a não aplicação da Lei dos Juizados Especiais Criminais ( Lei 9.099/95), em casos de violência doméstica.


2- Hodiernamente já não se discute qual é a natureza jurídica dos Tratados de Direitos Humanos, isto é, não resta dúvida acerca de sua posição na “pirâmide jurídica”, conforme o firme posicionamento do ministro Celso de Mello, lido em 12 de março de 2000, em uma ação de Habeas Corpus proveniente do estado de Tocantis (HC 87.585), no Pleno do STF, reconhecendo o status constitucional dos tratados internacionais sobre direitos humanos, assegurando assim, a paridade constitucional.

É ESSENCIAL CONHECER INSTITUTOS DE DIREITO PENAL

É importante para advogado conhecer tecnicamente tipos penais
Recentemente, ao observar uma questão prática de um Exame da Ordem, deparei-me com um questionamento em que se exigia do examinado um conhecimento teórico (técnico) de institutos de Direito Penal, e com base nestes, deveria o examinado elaborar um arrazoado em defesa de seu “cliente”.
A questão envolvia conhecimentos acerca do crime continuado, do concurso material e da objetividade jurídica do delito, bem como da diferenciação entre os delitos de roubo e seqüestro, portanto, com base nesses elementos, estaria sendo discutida qual seria o quantum da pena a ser aplicada na declarada sentença condenatória.
Assim, ao “recorrente” que contasse com um “bom advogado” (examinado), a conseqüência penal (reclusão) seria bem menor do que aquela a ser aplicada ao “recorrente” que não contasse com a presença de um “profissional qualificado”, ou dito de outra forma, sem a presença de um examinado preocupado com o saber jurídico.
Era mais ou menos assim o caso prático:


a) Agentes apontam revólver (municiado) e retiram a vítima do interior de seu veículo automotor; subtraindo o veículo;
b) Após três semanas, o mesmo agente mediante arma de fogo (municiada), aponta-a em direção à uma mulher, e exige que seu filho vá ao estacionamento e entregue uma motocicleta a um comparsa que o aguardava adiante (os agentes eram reincidentes e a mulher tinha 61 anos de idade quando do crime).

Apurado o fato, realiza-se a instrução, havendo a confissão do delito pelos infratores, sendo que as testemunhas e as vítimas reconheceram os agentes do crime, bem como se demonstrou a materialidade delitiva, não existindo qualquer causa que pudesse excluir ou minimizar a ilicitude ou a culpabilidade dos responsáveis.
Nesses termos foi proferida sentença condenatória em razão do concurso material entre dois roubos, sendo que na sentença o juízo primário desprezou a causa genérica de diminuição de pena contida no Código Penal 65, letra D, ou seja, a confissão, bem como reconheceu a reincidência sem que houvesse certidão nos autos.
O examinado não tão bem preparado, fatalmente proporia a peça de Apelação, e pediria ao Tribunal ad quem, somente, o reconhecimento da confissão, bem como alegaria que a reincidência não poderia ter sido reconhecida pelo juízo primário face ausência de prova documental nos autos. Sem dúvida, nesse aspecto, não há o que ser contestado.
Aproveitando a oportunidade e apenas fazendo um paralelo com o narrado na questão, verifica-se que tais fatos ocorrem diariamente no cotidiano, portanto, exige-se do profissional do direito (juiz, promotor, advogado etc) uma capacitação cada vez maior para que seja aplicada as regras do ordenamento jurídico, e assim, não se cometa os “equívocos” tão constantes.
Retornando ao tema, se ficar evidenciada a prática de dois delitos da mesma espécie (dois roubos ou duas extorsões), será aplicado o instituto da continuidade delitiva (CP 71), ou seja, haverá um acréscimo provável de 1/6 [1] sobre a pena, ao passo que, restando o cúmulo material (CP 69), haveria a somatória das respectivas penas, isto é, seria bem maior do que na hipótese do crime continuado.

Da continuidade delitiva e crimes da “mesma espécie”
Nos escólios doutrinários, narra-se que o instituto do crime continuado teve origem entre os séculos XVI e XVII, e sua introdução no ordenamento jurídico fazia sentido, tendo-se em vista a severidade da sanção penal em razão da prática do terceiro furto pelo agente (punia-se com aplicação da sentença de morte).
É que à época, a Europa atravessava fortíssima crise econômica, ou seja, imperava a fome e a miséria, portanto, a aplicação do instituto suavizaria (e muito) a sanção penal, vez que a pena, não seria a morte do agente.
Na atualidade nacional, ocorrendo um delito continuado, a conseqüência é o acréscimo de 1/6 até 2/3 na pena, mas para que tal ocorra, dentre outros requisitos, os crimes devem ser da mesma espécie, e praticados no prazo (via de regra), não superior a 30 dias [2].
Mas o que significa “crimes da mesma espécie”?
Ainda não há pleno consenso do que venha a ser “crimes da mesma espécie”, existindo, pelo menos, dois posicionamentos:

1) São os delitos previstos no mesmo tipo penal, isto é, aqueles que possuem o mesmo elemento descritivo não importando sejam figuras simples (caput) ou qualificadas, tentados ou consumados, culposos ou dolosos, assim, são crimes da mesma espécie o furto simples (CP 155) e o furto qualificado (CP 155, parágrafo 4º), a lesão dolosa (CP 129) e lesão culposa (CP 129, parágrafo 6º).
Defendem esta tese, entre outros, Nelson Hungria, Aníbal Bruno, Damásio de Jesus.
2) São os que ofendem o mesmo bem jurídico, embora previstos em tipos penais incriminadores diferentes. Cita-se como exemplo o roubo (CP 157) com a extorsão (CP 158), (cujos objetos jurídicos, são o patrimônio, a liberdade física e integridade individual), e o estupro (CP 213) com o atentado violento ao pudor (214), cujos bem jurídico é a liberdade sexual.
Abonam esse posicionamento, entre outros, Rogério Greco, Luiz Régis Prado e Delmanto.
Contudo, prevalece jurisprudencialmente a primeira posição (restritiva), todavia, a boa técnica e a lógica, nos impõe acordar com a segunda tese, pois, a razão de ser de um delito, tem tudo a ver com o bem jurídico tutelado pela norma penal [3].


Diferenciação entre roubo e extorsão
Ao presente assunto, também nos importa saber qual é a diferença essencial entre o delito de roubo e o delito de extorsão, pois, suas penas se equivalem (reclusão de 4 a 10 anos, e multa, na figura simples, e acréscimo de 1/3 a metade se qualificados).
Mas então, se as penas são as mesmas, qual seria a razão de ordem prática, que nos obriga a ter em mente os denominados conhecimentos técnicos?
Ora, simplesmente para que ocorra a boa interpretação e a conseqüente aplicação do Direito Penal face seus institutos.
A extorsão não se confunde com o delito de roubo, pois, nesse o agente toma a res pessoalmente (ele a subtrai), já na extorsão o autor faz com que a coisa lhe seja entregue (ou colocada à sua disposição), todavia, o delito de roubo e o de extorsão possuem a mesma objetividade jurídica, isto é, tutelam a integridade física o patrimônio e a liberdade individual do ser humano, portanto, não há razão alguma para que se adote o critério restritivo para a conceituação do que sejam crimes da mesma espécie, a interpretação deve levar em conta a ofensa ao bem jurídico, assim, ad exemplum, a apropriação indébita e o furto admitiriam a continuidade delitiva, pois, deve-se entender como delito da mesma espécie aqueles crimes que tenham o mesmo objeto jurídico, e que guardem, entre si, semelhança em seus elementos subjetivos e objetivos.
De outro vértice, é salutar relembrar que a situação se inverte quando se analisa o crime de furto com o crime de roubo, pois, embora tutele-se o patrimônio em ambos os delitos, no delito de roubo existem outros dois bens a serem protegidos (liberdade individual e a integridade física), assim, resta eventual concurso material de delitos entre esses dois tipos penais.
Enfim, voltando ao problema inserido no Exame da Ordem, (e tentando resolver a questão formulada pelo examinador), deveria o examinado, nos termos do CPP 593, I, interpor o Recurso de Apelação, e alegar a omissão do julgador quando do não reconhecimento da atenuante da confissão, bem como requerer a invalidação do aumento de pena, face a ausência da certidão que comprovaria a reincidência dos agentes, e principalmente, levar ao conhecimento do Tribunal ad quem (examinador), a possível continuidade delitiva entre o delito de roubo e de extorsão, mesmo que a tese não seja abonada jurisprudencialmente, pois, importa ao estudante e ao operador do direito o conhecimento dos aspectos técnicos da Ciência Penal, e seria também demonstrada as diferenças existentes entre o delito de rouco e o delito de extorsão,
Assim, a conseqüência de ordem prática é a seguinte: na eventual condenação, a pena a ser aplicada seria bem menor em razão da observância da continuidade delitiva.
É o que há.


Notas:
1 — Quanto maior o número de delitos praticados, maior será a exasperação, tendo a jurisprudência admitido o seguinte cálculo: 2, 3, 4, 5, 6, 7 ou mais crimes, acréscimo de 1/6, 1/5, ¼, 1/3, ½, 2/3, respectivamente.
2 — Diz-se 30 dias, via de regra, em razão de que nos crimes cometidos anualmente, tais como, alguns delitos tributários, deve-se admitir a continuidade delitiva em termos anuais.
3 — Cita-se a seguinte situação trazida por Jair Leonardo Lopes, citado na obra de Nucci: Imagine-se um balconista, que diariamente, deixa de inserir no caixa certa quantia em dinheiro. Posteriormente, durante outros dias, na ausência do patrão, subtraia outra quantia em dinheiro.
Assim poderíamos tipificar: a primeira conduta, CP 168, par. 1º, III; a segunda conduta, CP 155, parágrafo 4º, II. O bem tutelado é o patrimônio, assim, é indiferente estarem as condutas tipificadas em diferentes tipos penais. Seria razoável e proporcional admitir-se a continuidade delitiva, pois, o concurso material seria desproporcional.

LEI SECA: MAIS UM ERRO DO LEGISLADOR.

Lei Seca  vai  anistiar motoristas irresponsáveis!

Desde o dia 20 de junho de 2008(entrada em vigor da “Lei Seca”), o Estado na tentativa de endurecer o Código de Trânsito, acabou beneficiando irresponsáveis motoristas em razão de conduta realizada até o dia 19 de junho de 2008. É que há um Princípio em Direito Penal aduzindo que, se surgir uma lei que de qualquer modo beneficie o acusado, ela retroagirá, isto é, alcançará fatos anteriores à sua vigência, a exemplo do que ocorreu com a descriminalização do delito de adultério (quem foi processado ou condenado em razão da traição conjugal teve a punibilidade extinta).
A nova lei, ao contrário da anterior, prevê para ocorrência do delito de embriaguez ao volante, a necessidade da presença de pelo menos 6 decigramas de álcool por litro de sangue, assim, a nova lei é mais benéfica que a anterior no tocante à produção de provas, pois, limita-a, vez que a constatação da dosagem somente é possível por meio de exame específico, ou seja, não se admite outro tipo de prova, tal como a testemunhal.
Portanto, em situações anteriores à “Lei Seca”, respondendo o motorista ao delito de embriaguez ao volante, a lei nova deverá ser aplicada, ou seja, para que ocorra o crime é imperioso que tenha havido a presença de pelo menos 6 decigramas de álcool por litro de sangue, e de outro vértice, se o motorista não permitiu a coleta de sangue ou não fez o teste do bafômetro, não poderá ser compelido a fazê-lo, porém, mesmo que o faça, de nada adiantaria, pois, o transcurso do tempo eliminaria qualquer quantidade de álcool no sangue do motorista infrator.
Como a lei nova nesse aspecto é mais benéfica que a anterior, deve retroagir, isto é, deve ser aplicada aos crimes ocorridos antes de sua entrada em vigor.


Conclusão
1) a nova lei exige para a caracterização do delito a presença de no mínimo 6 decigramas de álcool por litro no sangue, e essa constatação somente pode ser provada por meio de exames específicos.
2) caso o motorista que praticou a conduta criminosa antes da vigência da nova lei não tenha se submetido ao aludido exame, o Estado não terá como condená-lo, vez que é impossível qualquer exame constatar a presença da droga no sangue do motorista face o tempo decorrido, e mesmo que essa possibilidade ainda existisse, seria ilógico crer que o acusado fosse realizar o aludido exame para que sofresse a sanção penal.
3º) ademais, como o Estado não pode provar nada contra o motorista, deve absolvê-lo em razão da insuficiência de provas, e caso o motorista encontre-se preso, deve de imediato ser solto, e ao final da ação penal deve-se ser declarada fim da punibilidade.
4º) a constatação de nível de álcool no sangue do motorista somente pode ser feita por meio de exame que exija sua ativa participação (coleta de sangue ou bafõmetro), e face nosso ordenamento jurídico, pode haver a recusa pelo acusado, portanto, se o agente não fizer o teste, será impossível verificar a quantidade proibida por lei, assim, o motorista não poderá ser autuado em flagrante pelo delito de embriaguez, e nem tampouco poderá ser instaurado a persecução penal, ou seja, não haverá inquérito policial e nem tampouco a ação penal.
Ou melhor, como o Estado poderá condenar o irresponsável motorista, sem provas idôneas? As conseqüências vindouras serão catastróficas.
É o que há!

Saudações!!!

Prezado leitor, tem o presente a finalidade de lançar comentários críticos e imparciais acerca de envolventes temas de Direito Penal e Processo Penal, sob uma visão Constitucional e Humanista, isto é, uma visão de acordo com princípios da Carta Magna e dos Tratados e Convenções em que o Brasil é signatário, e de outro vértice, pequenos comentários sobre Política (nacional ou não), cultura, esportes, bem como assuntos que levantam interesse de mentes preocupadas (ou não!) com o que acontece ao nosso redor.Boa leitura...ah, suas observações serão bem recebidas!Atenciosamente,
Jorge Alexandre Karatzios.

DESCRIMINILIZAÇÃO DO USO DE DROGAS: AVANÇO OU RETROCESSO?

MACONHA: CONTRA OU A FAVOR?
 A Corte Constitucional  da Argentina, em votação unânime (7 votos) reformou decisão condenatória pelo delito de posse de droga para uso pessoal, isto é, absolveu um cidadão, descriminalizando a conduta de quem (acima de 16 anos) portar substância entorpecente para uso próprio. A decisão teve como fundamento um artigo da Constituição que assegura a não responsabilidade em relação às ações privadas que não ofendam a ordem ou a moral pública, e que não prejudiquem terceiros, acompanhando uma tendência em nível mundial contra a política repressiva, sendo que no início do mês de agosto, o México descriminalizou legislativamente a posse de drogas para consumo próprio, seguindo os passos da Colômbia (grande produtor) que já em 1974 declarava inconstitucional a lei que punia o porte para uso pessoal.
A decisão da justiça argentina também é fundamentada em tratados internacionais ao asseverar que “o direito à privacidade impede que as pessoas sejam objetos de ingerência arbitrária ou abusiva na esfera privada”, outrossim, na sentença foi levado em conta o argumento de que “ os viciados em drogas, as vítimas mais visíveis, são os próprios consumidores e suas famílias”, portanto, este consumidor está sendo vitimado duplamente: a primeira pelo uso, e a segunda, pela punição, constando na decisão a advertência de que o poder público deve garantir uma política contra o traficante, adotando medidas preventivas de saúde, tais como campanhas educativas dirigidas aos cidadãos mais vulneráveis.
No Brasil, quem for flagrado com entorpecentes, desde que não tenha o intuito de repasse, está sujeito a pequenas “punições”, tais como: advertência pelo juiz, multa, etc., contudo, em nenhuma hipótese a pessoa será levada em cárcere, mesmo que pratique a conduta dezenas de vezes, vislumbrando assim uma possível descriminalização. A idéia da pena é no sentido de evitar que o cidadão se torne um viciado, e que com isso possa praticar crimes, pois, sem o devido equilíbrio ficaria “mais à vontade” na conduta delituosa, todavia, estar-se-ia punindo alguém, pelo que ela poderia realizar, num autêntico direito penal do futuro, vindo a norma a coibir com sanções, quem pudesse ter em sua mente a idéia delitiva.
De outro vértice, temos que estar atentos que outras drogas (lícitas) tais como o álcool, possuem o mesmo efeito, e nem por isso a conduta de ingeri-las é punida, ao contrário, ela é estimulada nos veículos de comunicação em massa, por meio de peças publicitárias e filmes, então, soa estranho o castigo para quem for pego portando drogas para seu uso pessoal, ficando o seguinte questionamento:
“o usuário ou dependente deve ser punido face uma probabilidade de no futuro praticar crimes?”
Frise-se que personalidades brasileiras defendem a não punição, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que publicamente no fórum “Comissão Brasileira sobre Drogas e Democracia” ocorrido recentemente no Rio de Janeiro, defendeu a descriminalização, bem como o emprego de campanhas para desestimular o uso de drogas, no que parece estar com a razão, vez que no Brasil praticamente não existe uma intensa participação de órgãos governamentais (frise-se que nem no seu mandato isso ocorria), então, deveríamos usar a imagem de celebridades (Kaká, Ronaldo etc) alertando sobre os malefícios do consumo, assim, estaríamos dando um grande passo na expectativa de, não viver num mundo totalmente livre de drogas, mas sim diminuir drasticamente os malefícios que elas nos causam.
O assunto é delicado, e merece atenção especial de todos.
É o que há!

Quem sou eu

Minha foto
são paulo, são paulo, Brazil
profissional crítico do Direito...que concilia a racionalidade com as emoções..ou pelo menos tenta....avesso à perfídia...e ao comodismo que cerca os incautos... em tempo: CORINTHIANO!!

Seguidores

Arquivo do blog

Powered By Blogger

Páginas