terça-feira, 10 de abril de 2012

Aborto anencefálico: STF dará à luz sua decisão- LUIZ FLÁVIO GOMES 



Depois de sete anos, está tudo programado para vir à luz, no próximo dia 11.04.12, a decisão do STF sobre o aborto anencefálico. A questão é delicada porque possui um fundo religioso e ético.

 A anencefalia é uma malformação embrionária que atinge mais ou menos 2 em cada 10 mil nascimentos. Consiste na ausência de encéfalo e da calota craniana. Não há formação dos ossos do crânio e do cérebro. A morte do feto é inevitável (de acordo com a ciência médica).
 Não existe vida futura (viável). Por isso que a morte (abreviada) desse ser não é abusiva ou arbitrária. No plano jurídico a vida humana está assegurada pelo art. 4º da Convenção Americana de Direitos Humanos. Ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente (diz referido artigo). Esse é o Estado de Direito vigente.
Se a morte do anencéfalo não é arbitrária, não há que se falar em crime de aborto (que pressupõe um resultado jurídico desvalioso, de acordo com nossa teoria constitucionalista do delito, que está fundada nas teorias de Roxin e Zaffaroni). Não se trata de um resultado intolerável. No plano da tipicidade material afasta-se a tipo penal (esse é o melhor fundamento jurídico para não incriminar).

 No plano religioso o cardeal Odilo Pedro Scherer escreveu: o sofrimento da mãe a dignifica, nenhuma vida pode ser destruída etc.
Respeitamos sempre os posicionamentos religiosos, porque aceitamos a pluralidade de crença. Mas a questão deve ser solucionada no plano jurídico. Nosso país é laico. Entre a fala da Igreja Católica e o art. 4º mencionado, vale o texto jurídico. A mulher tem que ter o direito de abortar, nessa situação anormal, se ela quiser.
 É uma questão de dignidade. Ninguém deve ser submetido a sofrimento inútil (que se torna torturante). O Caso Severina (há um documentário sobre isso, que recomendo) é bastante elucidativo (chocante e emocionante). Se a mulher, por razões religiosas, não quer abortar, temos que respeitar sua vontade e suas convicções. É assim que o direito convive com a religião. O plano coercitivo (jurídico) é distinto do plano moral. Razões religiosas não podem ser invocadas nas decisões judiciais. Isso está proibido no Brasil. Faz bem o STF em decidir essa tormentosa questão (tal como a união homoafetiva, uso de células-embrionárias etc.), porque não se pode esperar que um Congresso Nacional tão dividido religiosamente o faça.

 O ativismo judicial para proteger direitos fundamentais não regulamentáveis (ou dificilmente regulamentáveis) pelo Parlamento se justifica. Foi isso que fez a Corte Suprema da Inglaterra há poucos dias em relação ao “suicídio assistido”. A decisão do STF ainda se justifica em razão da natureza “classista” da questão: somente pobres (ou fundamentalmente pobres) é que buscam autorização judicial (porque devem usar os hospitais públicos). As classes média e alta contam com apoio de hospitais particulares.
 O direito também deve ser seguro para os miseráveis. Princípio de justiça. Confundir o aborto anencefálico com eugenia (nazista) é lamentável. Que venha à luz a decisão do STF. Tirando os juízes da Corte que acham que o sofrimento dignifica a mulher, todos os demais votos certamente serão favoráveis à tese do aborto anencefálico.
Aguardemos! Na quarta-feira estarei vendo a sessão de julgamento e comentando o caso. Avante!

É isso!

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