sexta-feira, 6 de junho de 2014

Sarney: eventual crime já prescreveu (o Estado brasileiro é o maior crime organizado LUIZ FLÁVIO GOMES

 " o  Estado brasileiro se tornou (também) um grande crime organizado."



Um dia antes da intervenção do Banco Central no Banco Santos, em 2004, Sarney resgatou da sua conta bancária mais de R$ 2 milhões. O MPF (SP) suspeitou que o parlamentar teria informação privilegiada. O inquérito só foi remetido ao STF no dia 19/5/14, dez anos depois. O Procurador-Geral da República pediu a prescrição porque Sarney já tem mais de 70 anos (a prescrição de 12 anos caiu pela metade). Ou seja: crime já está prescrito. Dias Toffoli (no STF) arquivou o caso. Sarney está livre do crime, “se é que aconteceu, disse o PGR”). 

O inquérito tramitava na 6ª Vara Criminal da Justiça Federal em SP. Em maio de 2014, dez anos depois dos fatos, ele foi remetido para o STF, porque José Sarney é parlamentar, que deve ser julgado pela Corte Suprema. No plano penal o arquivamento se tornou inevitável. No plano criminológico, esse caso possui uma riqueza de questionamentos impressionante, que se alinha com a tese de que o Estado brasileiro se tornou (também) um grande crime organizado.

Explica-se: O Estado brasileiro, como todos os demais, é uma hidra (conta com muitas cabeças) hecatônquira (cem mãos) e centopeica (cem pés). Há, portanto, cabeças, mãos e pés para o bem e para o mal. Nem tudo que o Estado faz é um crime.

Grande parte da sua atividade, no entanto, faz parte de uma organização criminosa, constituída de 4 ou mais pessoas, estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas; há organizações formais e informais; sempre, no entanto, com o objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza (pecuniária, política, competitiva etc.), mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 anos. 

Algumas vezes tem caráter transnacional. Todos os requisitos da organização criminosa estão presentes em grande parte do que o Estado brasileiro faz. Faz o bem (distribuição de renda aos necessitados por meio de bolsas família, por exemplo) e também faz o mal.

A troika maligna que forjou e protagoniza um dos maiores crimes organizados do planeta é composta de 
(1) agentes financeiros especuladores (estou falando dos “especuladores”, não de todos os agentes financeiros), (2) agentes econômicos extrativistas (estou falando das empresas e corporações que só pensam em lucros ilícitos, abusivos e/ou parasitários) e (3) agentes públicos corruptos (estou falando dos corruptos, de todos os poderes, incluindo-se aí todos os políticos, naturalmente, com as ressalvas necessárias).
 Ferrajoli (2014/1), num recente trabalho, engrossando as doutrinas de Morrison, Zaffaroni, Bernal, Rivera, Vidal etc., coloca em pauta o objeto de estudo da criminologia, que sempre se ocupou do ladrão de galinha, sem dar a devida atenção aos genocídios, às “guerras humanitárias”, aos crimes de guerra cometidos pela OTAN e pelos EUA, aos genocídios dos Estados.

 Que tem a criminologia a dizer sobre as catástrofes terríveis da fome, da sede, das enfermidades e da devastação ambiental causadas pelo atual anarcocapitalismo assim como pelo mercado financeiro sem regras? Retomaremos, em outros artigos, esse fértil questionamento levantado por Ferrajoli e tantos outros criminólogos. Por ora, que semelhança existe entre a troika citada e o tráfico de drogas?

A troika maligna mencionada, desde logo, tem as mesmas características do tráfico de drogas localizado, que sempre espoliou a população miserável (que é a que tontamente vai para a cadeia), para cumprir seus dois propósitos: (a) a concentração do dinheiro do bairro nas mãos dos donos do tráfico (nas mãos de poucos); (b) servindo a narcoquímica para manter a população local em um estado suficientemente débil e desesperado para não poder rebelar-se (Taibbi: 2013). Quanto mais droga se distribui, mais fragilizada, adicta e dominada ficam as pessoas.

No país chamado Brasil, a troika distribui outras drogas, como a da corrupção, da violência e da desigualdade animalesca entre as pessoas. Todas, em conjunto, estão destroçando e despedaçando a população e a nação. Os produtos que a troika distribui, portanto, não são o crack ou a cocaína, sim, escândalos, maracutaias, acordos escusos, vantagens, impunidade, prescrição de crimes, enriquecimentos ilícitos, cadáveres, medo, insegurança, salários precários etc. 

Tal como se passa no narcotráfico, a troika maligna e criminosa concentra com uma eficácia medonha o dinheiro da população em pouquíssimas mãos (as poucas famílias – os capos da troika -, que detêm 70% do PIB nacional, não se mostram nada abertos nem sequer a dialogar sobre um pacto nacional de emancipação do povo por meio da educação de qualidade para todos).

Semelhantemente ao tráfico de drogas, os produtos que a troika distribui (dívidas impagáveis, desespero, cadáveres, indignação, violência, medo, insegurança, sensação de impotência etc.) vêm desmoralizando o brasileiro a ponto de torná-lo incapaz de se rebelar contra a sua dominação parasitária permanente. Altíssima concentração da renda e do capital (tal como denunciada por Piketty) e desmobilização e desmoralização da população inculta e carente: como se vê, a troika maligna usa as mesmas técnicas dos traficantes.

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